A promessa do sol de inverno

A rotina semanal só se torna suportável porque a Vision me leva e traz, fiel, mesmo quando o céu decide desabar sem aviso. Há dias em que a chuva parece ter sido contratada a tempo inteiro, como se alguém tivesse decretado que a água faz parte obrigatória do trajeto. Ainda assim, seguimos. O motor acorda, eu desperto com ele, e juntos abrimos caminho por ruas brilhantes de água.
Mas, quando por milagre o sol aparece, mal o tocamos: um raio breve na hora de almoço, outro a cortar o regresso ao trabalho. É tudo. Vivemos encolhidos dentro do outono, e o inverno aproxima-se com aquele jeito de quem não pede licença. O direito à luz vai-nos sendo retirado aos poucos — à saída já é noite profunda, e a viagem de volta faz-se apenas com a coragem dos faróis da Vision e a claridade fria da iluminação pública, que pinta tudo num amarelo que não aquece.
Ao fim de semana, devíamos respirar. Mas o céu, ciumento, fecha-se de novo. A chuva regressa como se tivesse saudades nossas. E o mais curioso é que ainda nem entrámos no inverno. Fico a pensar se também nos será negado aquele sol de inverno — frio, mas franco — que às vezes salva um dia inteiro sem fazer esforço. Porque este outono tem sido um corredor de nuvens, onde a luz apenas espreita por uma nesga, e mesmo assim com vergonha.
É verdade que o céu cinzento, quando se estende em lençol, tem uma serenidade própria. Há ali qualquer coisa de repouso, um silêncio que se pousa nos ombros. Mas eu e a Vision queremos outra coisa. Queremos aquele sol fino que se deita sobre o alcatrão como um lençol morno; aquele sol que não incomoda, não fere, não reclama atenção — apenas acompanha. O sol de inverno que nos devolve o corpo depois de uma semana inteira a andar às apalpadelas pela escuridão.
E é por esse sol que esperamos. Como quem espera alguém que prometeu voltar. Como quem abre a porta antes de ouvir bater.