A Minha Honda vai ao Japão (ou quase)

Acordei com um e-mail da Honda. Pensei que fosse mais uma newsletter qualquer, daquelas que falam em revisões, novos modelos e campanhas que nunca são para a minha carteira. Ou que fosse o pessoal do marketing a sugerir-me mais uma colaboração para as redes sociais da marca. Mas não. O assunto dizia apenas:
“Daniel, temos uma proposta.”
Abri meio a medo, meio a rir sozinho, porque ainda não tinha tomado café e o cérebro gosta de inventar entusiasmo à toa. Mas estava lá tudo, preto no branco: uma viagem ao Japão, para duas pessoas, tudo incluído. Motivo? O blogue. O meu blogue. Aquele que nasceu num domingo de tédio, num impulso de achar que talvez valesse a pena escrever sobre os meus pequenos percursos pela cidade.
Viraram-me as mãos. Assim, sem aviso.
Fui mostrar à minha mulher. Ela, que não gosta de motas, leu aquilo com sobrancelhas semicerradas — sinal de que estava a avaliar se isto era mesmo real ou mais uma das minhas leituras emocionais erradas.
— Isto é a sério?
— Acho que sim.
— E é para irmos os dois ao Japão?
— Parece que sim.
— Por causa da mota?
— Bem… por causa do blogue da mota.
— Meu Deus.
Aceitou logo, claro. Uma pessoa pode não gostar de motas, mas também não é parva.
E pronto, naquela noite adormeci a imaginar-me em Tóquio, a pousar num país onde as passadeiras tocam música e as máquinas de venda automática vendem tudo menos vergonha. No dia seguinte levantava-me cedo e apanhava um comboio de alta velocidade até Motegi para visitar o Honda Collection Hall — esse templo de metal e história. Via-me a entrar devagar, como quem tira o capacete à porta por respeito. Era como estar na casa de alguém que conheço desde sempre, mas que nunca me convidou formalmente.
E ela ao meu lado, surpreendentemente envolvida, a dizer:
— Olha, este até é giro.
E eu sem saber se falava do museu, da mota, ou do Japão inteiro.
A viagem acabou quando o despertador tocou. A Honda não me escreveu. Não havia bilhetes para Tóquio, nem comboios a atravessar paisagens que parecem filmes. Havia apenas a Vision na garagem à minha espera, como sempre.
Mas enquanto descia a rua para o trabalho, senti qualquer coisa boa: a sensação de que, mesmo que a viagem não exista, há um caminho que continua a abrir-se. Lento, inesperado, com curvas simpáticas — como quem segue por Braga fora numa manhã fria.
E no fundo, embora eu saiba que nunca lá vá, há sempre um pequeno Japão à minha espera.