O leitor mais antigo

7 novembro 2025

Fui levar umas lembranças do blogue a um leitor. Provavelmente o mais antigo de todos — alguém que já foi meu cunhado, mas com quem nunca perdi o contacto. Estava fora, mas passei por casa dele e deixei o pequeno embrulho na caixa do correio. Só depois lhe enviei uma mensagem — o gesto já lá estava.

A manhã estava nublada, daquelas em que o outono já não se anuncia — está mesmo ali, na aragem e no brilho da estrada molhada. O caminho até lá faz-se por entre árvores que ainda pingam da noite anterior, com o verde a escurecer na encosta e o cheiro a folhas húmidas a colar-se ao ar. Perto do destino, a paisagem abre-se em campos cultivados, onde a calma parece mais antiga do que o próprio tempo. A Vision parecia gostar do silêncio: pouca gente, pouco trânsito, só o barulho da água a ser cortada pelas rodas.

No regresso, dei-lhe uma lavagem rápida. Tinha lama junto às rodas e pequenas marcas de chuva secas pelo corpo. Passei-lhe um pano e ela voltou à garagem — depois de uns dias de exílio ao relento, por ordem da minha mulher. Agora voltou a ter abrigo, como quem recupera o lugar na casa depois de um pequeno desentendimento.

Talvez seja assim também com os afetos antigos: às vezes afastam-se, ficam à chuva, mas acabam sempre por regressar ao seu lugar.