A política ao retrovisor

6 outubro 2025

Pensei que tinha escrito apenas mais uma crónica: um texto sobre buracos, passadeiras e o silêncio das candidaturas em Braga perante a vida dos motociclistas. Publiquei, fechei o computador e segui viagem — porque a cidade não espera por ninguém, muito menos por quem anda em duas rodas.

Horas depois, o inesperado: candidatos respondem-me diretamente. Frases curtas, quase tímidas — mas que soaram mais alto do que muitos cartazes colados nas paredes.

Na manhã seguinte, a surpresa repetiu-se: um email formal, assinado pela assessora de uma candidatura, agradecendo em nome do candidato, elogiando o blogue e prometendo atenção futura. Palavras alinhadas, seladas com carimbo político.

Dias depois, percebi que havia mais ecos do que pensava. O primeiro texto começou a aparecer nas redes sociais: páginas oficiais de candidatos, estruturas locais do partido, juventudes, militantes. O mesmo texto multiplicado em diferentes perfis, como se tivesse sido convocado para uma campanha que nunca planeei. De repente, aquela crónica discreta — nascida para ser lida ao acaso — circulava como argumento político.

E eu, que costumo escrever sobre a chuva que ameaça, os cafés apressados ou a rotina de estacionar a Vision, percebi de repente que A Minha Honda tinha saído da esfera íntima para tocar no debate público. Um blogue pessoal, nascido da vontade de registar o quotidiano, acabava de se cruzar com a maquinaria oficial da política.

Não é vaidade. É espanto! Porque um blogue não é jornal nem púlpito, não tem câmaras de televisão nem outdoors espalhados pela cidade. É apenas um canto discreto da internet, sem megafones nem holofotes. E, no entanto, bastou uma crónica para que alguém em campanha parasse, lesse, respondesse — e partilhasse.

Talvez seja isso que me fascina: a noção de que a cidade também se escreve a partir de pequenos gestos. Uma buzina discreta pode não mudar o trânsito, mas lembra que existimos. Uma pergunta simples pode não alterar programas eleitorais, mas quebra o silêncio.

Continuarei a escrever sobre buracos no alcatrão, semáforos teimosos e mochilas carregadas de jantar. Mas agora sei: até esses relatos — aparentemente banais — podem ganhar peso político. E talvez seja inevitável: quando um blogue entra na cidade, também a política o tenta puxar para o seu trânsito.

Eu sigo viagem. Mas não deixo de olhar pelo retrovisor.