De capacete e coração

Braga parecia outra cidade. Ruas espessas, engarrafamentos que engoliam tempo, acidentes a salpicar o mapa urbano. Condutores distraídos espreitavam a desgraça alheia, abrandando para medir o drama. Entre sirenes e buzinas, eu tinha uma missão urgente: levar à minha sogra a morfina que o hospital não podia fornecer.
O dia começou cedo. Saco térmico no baú, água fresca, mantimentos. Um casaco para o frio artificial das enfermarias. Idas e voltas para cuidar do meu enteado, também hospitalizado. Cada minuto contava; cada gesto pesava.
No fim da tarde, a farmácia era o destino. Uma hora, curta e decisiva, entre a chegada da encomenda e a hora do fecho do internamento. Saí com um embrulho pequeno, selado, leve — mas carregado de urgência. Selos de morfina numa mão, capacete na outra.
A Vision cortou as brechas do trânsito como uma flecha no mapa torto da cidade. Carregou no baú o que o hospital não podia dar e levou às mãos certas um alívio imediato. Cada sinal fechado, cada curva, cada buzina parecia medir o tempo da missão.
Quando parei diante do hospital, o dia já se fechava em luz dourada. O mundo parecia respirar comigo. A entrega tinha chegado, silenciosa e completa, como se a própria cidade reconhecesse a urgência e o cuidado que carregava — de capacete e coração.